Não adianta negar. Eu sou machista.
Meus amigos homens são todos machistas.
A grande maioria das minhas amigas mulheres também são machistas.
Todos homens da minha família são machistas.
A grande maioria das pessoas nas diversas comunidades de desenvolvimento de software são machistas.

Não adianta ter uma namorada feminista.
Não adianta ter uma assessora de comunicação feminista.
Não adianta ter uma mãe feminista roots que sempre me mostrou direta ou indiretamente como o mundo é machista.
Não adianta ter um irmã de 12 anos, que mesmo sem saber exatamente o que é feminismo, já defende a causa como ninguém.

Não adianta ter exemplos horríveis de machismo na família durante a vida inteira.
Não adinta ter presenciado o machismo de perto em empresas que trabalhei.
Não adianta ter presenciado o machismo na essência em eventos de tecnologia.

Eu sou machista, e você, caro leitor, também é machista.

A surra

Hoje tomei uma surra. Daquelas surras de ficar cansado, sabe? De ficar triste.
Calma calma, estou bem fisicamente. Foi uma surra virtual.

Para quem não me conhece, eu sou um desenvolvedor de software e empresário.
Eu sou sócio-fundador da Nasc, empresa que é responsável pelo maior evento JavaScript do planeta, a BrazilJS Conf.
Além das 6 edições da BrazilJS Conf, eu também organizo alguns eventos regionais.
No total, já devo ter organizado mais de 20 eventos na área de tecnologia Web nos últimos 7 anos.

Hoje anunciamos os primeiros palestrantes do FrontInPoa, evento dedicado às tecnologias FrontEnd, que acontece aqui em Porto Alegre.
Logo após o anúncio, a Fernanda questionou (e com razão), a falta de mulheres na grade do evento.
Nosso setor de comunicação logo levantou a questão, e ingenuamente (falha minha, pois devia ter tratado do assunto com mais atenção) pedi para que respondessem o tweet da Fernanda, argumentando sobre o Call For Papers que ainda está aberto e que teríamos sim mulheres palestrando no evento.
À partir daí foi ladeira à baixo.

O tweet resposta da BrazilJS não foi legal (Inclusive apagamos. Não por querer esconder algo, mas sim por vergonha mesmo).
Eu resolvi tomar a linha de frente e pedi para falar com a Fernanda via DM, e isso só piorou a situação.

Na minha cabeça eu estava sendo super bacana em mostar algumas das ações que fizemos neste ano, como ter 9 mulheres palestrando na BrazilJS Conf, como ter a Alda Rocha fechando o evento com chave de ouro falando sobre o empoderamento feminino.

Mas como eu deixei bem claro no início do post: Eu sou machista.
Minha tentativa de mostrar para a Fernanda o trabalho que fizemos foi machista. E o pior, eu nem sabia que estava sendo machista.

No início, a abordagem da Fernanda me pareceu agressiva e até mesmo sem sentido.
Porém, analisando bem a situação, talvez esta deve ser a abordagem mesmo.
Só assim vamos mudar o jogo e ver com outros olhos a situação.
Eu nem imagino o que a Fernanda já passou e sofreu. Ou mesmo que ela não tenha vivido o machismo na pele (o que acho difícil), alguma amiga com certeza já viveu, ou quem sabe alguém da família.
O ponto é, levar um tapa na cara às vezes é bom. Nesse caso então, melhor ainda.
A Fernanda me fez enxergar que ainda estamos engatinhando.
Nossas ações com a BrazilJS podem ter sido legais e podem ajudar a mudar o cenário no futuro, mas estamos longe disso.

Futuro

Eu não quero ser machista.
Eu não quero que meninas sejam desencorajadas a irem em eventos de tecnologia por conta do ambiente machista.
Eu não quero que daqui alguns anos minha irmã sofra com o machismo.
Eu não quero que a minha namorada enfrente qualquer tipo de machismo no trabalho, eventos, ou qualquer outro lugar.
Eu não quero que as Fernandas do Brasil se sintam oprimidas via Twitter ou via qualquer outro meio de comunicação.

Eu quero que a BrazilJS Conf e todos eventos que eu organizo ou participo sejam totalmente inclusivos.
Eu quero que as comunidades de desenvolvimento de software evoluam ao ponto de não existir mais machismo.

Eu gostaria que a Fernanda continuasse apontando o que está errado.
Eu gostaria que a Fernanda me desculpasse.
Eu gostaria que a Fernanda participasse de um dos eventos que organizo.